La Dolce Vita
Paulo Maia
“A partir deste momento, pode-se dizer que a peste se tornou um problema comum a todos nós. Até então, apesar da surpresa e da inquietação trazidas por estes acontecimentos singulares, cada um dos nossos concidadãos continuara as suas ocupações conforme poderá, no seu lugar habitual. E, sem dúvida, isso devia continuar. No entanto, uma vez fechadas as portas, deram-se conta de que estavam todos, até o próprio narrador, metidos no mesmo barco e que era necessário ajeitar-se. Assim é, por exemplo, que, a partir das primeiras semanas, um sentimento tão individual quanto o da separação de um ente querido se tornou, subitamente, o de todo um povo e, justamente com o medo, o principal sofrimento deste longo tempo de exílio. ”
Trecho de “A Peste” (1947), de Albert Camus
Pode haver ainda capacidade de entendermos que tudo pode ser construído novamente num mundo que se pergunta o que está acontecendo.
Não há uma forma segura e confortável de passar por esta pandemia que estamos vivendo. Vidas serão perdidas pelo vírus e pelas consequências da mudança abrupta na economia. Desinformação já é um (des)serviço muito mais compartilhado nas redes sociais do que realmente dados objetivos que verdadeiramente poderiam ajudar a lidar melhor com o momento e nos orientar em ações para debelar o vírus e retomar nossas vidas.
O depois disso tudo poderá ser diferente? Ou não? Vai depender da nossa resiliência e da reflexão dos momentos do horror. Provavelmente somente aqueles que tiveram a morte próxima, como a perda de alguém da família ou do seu círculo de relacionamento, poderá ter mudanças mais profundas do que aqueles que apenas acompanharam números e histórias de notícias. Muitos dos que irão sofrer com a perda de emprego e alterações drásticas na sua cultura de consumo, culparão alguém por sua chaga. Sim, sempre haverá alguém culpado por ter atrapalhado sua individualidade e ter lhe tirado o conforto da vida moderna. Sempre teremos um motivo interior contra o outro.
Talvez saiamos dessa época maiores. Na grandeza, quero dizer. Pode haver ainda capacidade de entendermos, ao olharmos os milhares de anos de existência da espécie, que tudo pode ser construído novamente ou algo novo pode surgir! Somos uma espécie que se adapta, se reinventa e forja significados ao longo de eras e transformamos o mundo em algo que possamos chamar de nosso novamente.
Mas precisamos termos um pouco mais de humildade; um pé atrás, como dizia um amigo meu, em relação à vida que é frágil e não dá garantia de absolutamente nada. Apenas a nossa tenacidade pode garantir que haja luz amanhã. Ao passarmos por tudo isso, e para aqueles que ainda estiverem aqui, temos que fazer uma promessa que haverá um esforço para aprendermos um pouco mais e quem sabe assim poder honrar os mortos e preparar novas gerações com a sabedoria de quem já esteve e viveu por aqui.
Não há respostas seguras o suficiente para tempos incertos, por isso, termino aqui leitores com um conselho que acredito ser útil para toda a vida: preocupe-se em elaborar, formular bem uma pergunta, afinal se ela for ruim, sua vida estará à mercê de uma resposta medíocre e poderá não haver tempo a recuperar.
Paulo Maia é publicitário, filósofo, morador do Morumbi e mantém sua curiosidade sempre aguçada
Imagem destacada do artigo é de Kristina Tripkovic
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