Nova lei estimula geração de emprego para mulheres, seria esse um bom motivo para se comemorar?

Dolce Justiça

Dra. Rita de Cássia Biondo

Eu, como advogada, mulher, com jornada diária impossível de ser contabilizada dependendo do dia, e com demanda imensurável, acho sinceramente um retrocesso tamanho estarmos em pleno século XXI “comemorando” a aprovação de uma lei que “estimula” a geração de empregos às mulheres.

Porém, independente da minha opinião, estão aí os números, as estatísticas e a realidade nua e crua desse caminho árduo, tortuoso e moroso no qual as mulheres têm brilhantemente resistido e nos presenteado com as marcas de suas conquistas na nossa história.

Maria Quitéria, Tarsila de Amaral, Mary Wollstonecraft, Simone De Beauvoir, Margareth Thatcher, Clarice Lispector, Hilda Hilst, entre outras anônimas foram algumas das mulheres que deixaram suas marcas na história do Brasil e do mundo, mulheres essas que ocuparam posições de liderança ou simplesmente passaram pelos obstáculos que lhe foram impostos por conta do seu gênero.

A Revolução Industrial praticamente lançou a mulher branca ao mercado de trabalho, exercendo funções tipicamente masculinas, o que alterou a dinâmica social da época, vez que a mulher negra já vivia muito antes uma jornada desumana de funções, sendo mãe, dona de casa e trabalhando fora.

Com a mudança na dinâmica das atribuições na sociedade, o mundo se viu na obrigação de se transformar. Porém, mesmo diante dessa “obrigação” a desigualdade de gênero e de direitos sempre ocuparam o protagonismo na história da mulher. 

Nesse passo, não se pode deixar de evidenciar que mesmo com tantas discussões teóricas e a criação de legislações específicas para proteção e a concessão de direitos às mulheres, ainda persiste certa fraqueza na sua eficiência e no seu cumprimento dentro da sociedade.

Quando me referi a um caminho árduo, tortuoso e moroso no início do presente artigo, trago à reflexão de vocês, leitores, os casos das mulheres que são insistentemente assediadas e violentadas no ambiente de trabalho, das mulheres que desde a revolução industrial exercem a mesma função, com a mesma perfeição técnica, na mesma empresa e continuam percebendo remuneração inferior à dos seus partners do sexo masculino. 

Sendo assim, e vendo por esses outros lados, continuo achando que não é o caso de comemorarmos, ainda, pois mais importante do que sancionar uma lei é poder assistir a sua efetiva aplicabilidade e eficácia na nossa sociedade, algo que só o tempo irá dizer.

Pois bem, a Medida provisória que deu vida à lei sancionada, criou o programa Emprega + Mulheres, objetivando aumentar consideravelmente as vagas no mercado de trabalho a nós mulheres, no Brasil.

Dentre as ações previstas na lei, estão o pagamento de reembolso-creche, a flexibilização da jornada de trabalho, a qualificação do público feminino em áreas estratégicas, apoio ao retorno de trabalho após a licença a maternidade, a prevenção da violência e do assédio moral, maior acesso ao microcrédito, paridade salarial entre homens e mulheres na mesma função, entre outras.

Nessa seara é muito importante salientar o engajamento de algumas empresas e entidades de não só tornar a lei eficaz como, também, dentro de seu metiê, ampliar os benefícios legais.

Uma delas que merece todo meu destaque nesse sentido é Caixa Econômica Federal (CEF), pois não basta só criar um mecanismo para gerar empregos, importante também é criar uma forma de estimular a empregabilidade das mulheres, criando o programa “Caixa Pra Elas”.

Para se ter uma ideia da dimensão alcançada desse programa, em seu primeiro mês de implantação gerou nada mais, nada menos, do que 21 milhões de acessos computados. Segundo o banco, um crescimento expressivo na venda de cartões de crédito para mulheres, além de contabilizar seis vezes mais microcrédito comparado ao mês anterior.

Imagem de karlyukav no Freepik

O ponto de maior destaque na minha opinião se dá no auxílio prestado pela instituição ao incentivar mulheres em relação a abertura de seu próprio CNPJ, fornecendo cursos de educação financeira. Com isso, na prática, a mulher consegue seu CNPJ como microempreendedora, passa a ter acesso ao crédito de maior valor sem burocracias, propiciando uma ascendente em seu crescimento profissional, fundamental para sua independência no mercado de trabalho.

Que possamos daqui por adiante, além de presenciar a aplicabilidade e a eficácia da referida Lei, assistir iniciativas no mesmo sentido da CEF, independentemente de qualquer obrigação legal, pois estamos aqui falando de humanização, diversidade e pertencimento.

Encerro esse artigo com uma reflexão da filósofa, que particularmente sou fã, Marilena Chauí: “A alegria é o que sentimos quando percebemos o aumento de nossa realidade, isto é, de nossa força interna e capacidade para agir. Aumento de pensamento e de ação, a alegria é caminho da autonomia individual e política. A tristeza é o que sentimos ao perceber a diminuição de nossa realidade, de nossa capacidade para agir, o aumento de nossa impotência e a perda da autonomia. A tristeza é o caminho da servidão individual e política, sendo suas formas mais costumeiras o ódio e o medo recíprocos.

Rita de Cassia Biondo Ferreira é advogada graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Cidade de São Paulo, Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Superior de Advocacia e Pós-graduanda em Direito Coorporativo e Compliance na Escola Paulista de Direito. Especialista em Direito do Trabalho, Due Diligence Trabalhista, Direito Imobiliário, Direito das Sucessões e Prática Contratual atua como sócia-fundadora do escritório de advocacia D&B Advogados Associados e da empresa DBCOB Gestão de Créditos e Débitos.

Os artigos assinados não traduzem ou representam, necessariamente, a opinião ou posição do Portal. Sua publicação é no sentido de estimular o debate de problemas e questões do cotidiano e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo

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