Um conto em duas partes
Por Bernardo J. B. Figueiredo
Parte 1
O guarda-costas, Wolfgang, que mantinha as duas filhas do presidente sob constante vigília era frequentemente assediado por olhares amorosos da filha mais velha que Putin reconhecia oficialmente ser sua filha. Por conta dessa segurança exagerada ela não tinha oportunidade de procurar alguém que pudesse se apaixonar, se casar e constituir família. Seus 36 anos estavam passando em branco e isto a preocupava. Restava-lhe um dos seguranças que era uma pessoa bonita, forte, com idade compatível com a sua e as vezes a olhava manifestando amor enrustido, de maneira muito contido. Talvez tivesse uns quarenta anos. Seria ele ou nada. No momento que estavam sozinhos, fingiu que estava a cair e se agarrou a ele. Aos juntarem os corpos ela, ardentemente, o beijou e foi da mesma forma correspondida. Ele, muito assustado disse.
– Se o seu pai souber o que aconteceu, aqui, agora, tenho certeza de que irá me matar. Seu pai é um déspota e não mede os seus limites assassinos.
– O filho de meu pai com Maria Ivanova, não reconhecido por ele, fez carreira solo na política e, hoje, nesse ano de 2022 que estamos vivendo, ficou famoso pela sua eficiente performance no Kremlin. É sabido que é ferrenho inimigo do pai e isso agrada a maioria do povo russo, que quer paz e não guerra, cuja, desmantela as nossas famílias e, os bombardeios, as nossas cidades. Nenhum cidadão russo quer isto. Vou buscar a proteção dele, se você quiser casar comigo.
– É o que mais quero, mesmo pulando a fase de namoro e noivado, quando o casal se conhece melhor. Mas, também, se der errado, nos separamos. Não se esqueça que não sou o príncipe encantado, da nobreza russa. Sou um trabalhador de baixa instrução, que começou muito cedo a trabalhar em vez de estudar, para ajudar financeiramente em casa. Sou de família pobre, operária, como foram os seus avós, que geraram esse monstro que é o seu pai, que, a qualquer momento, me dá um tiro no coração, para eu ver se há vida espiritual além da morte.
– Quando surgirem novas oportunidades como essa, vamos conversar mais, pois é da conversa que se conhece o bom caráter das pessoas, se são confiáveis ou não.
– Ou se eu vou lhe falar de futebol e outros esportes e você de música clássica, ópera e da alta sociedade, pois são conversas que não irão nos unir no dia a dia, pelo contrário, irão nos separar de vez, diante de um casamento que, por isto, será chocho. Além disso, quando ligamos a tomada encima com os beijos, aquece em baixo com os desejos carnais e aí, como é que fica?
– A minha virgindade, faço questão absoluta de guardar para o casamento. Se nossos beijos nos afoguearem, eu paro imediatamente com eles.
– Já estamos entrando em discórdia!
– Natural para que tenhamos um bom entendimento.
– Fique tranquila que sei refrear o instinto sexual e dessa forma vamos nos dar bem, e, quando nos casarmos, bem melhor ao eliminarmos esse entrave.
– Vamos cortar nossa conversa, porque está vindo gente estranha que não jogam no nosso time.
Passaram-se três meses quando Putin chamou as filhas para uma conversa. Aconteceu no salão nobre da presidência. Ele estava na companhia do Presidente do Brasil. As duas foram devidamente apresentadas e, assustadas, sentaram-se no sofá oposto. Putin tomou a palavra.
– Bolsonaro é o presidente do Brasil que tomou na ONU posição a nosso favor contra a minha expulsão, requerida pelos Estados Unidos e pelos países da Europa Central. Politicamente posicionou-se neutro quanto as sanções que esses países gigantes querem aplicar contra o meu governo, justificando o voto a meu favor em plenário. Por outro lado, se eu continuar a insistir em retomar para a União Soviética a Ucrânia, que buscou a sua independência política ao participar do Tratado do Atlântico Sul, como país autônomo e livre da anexação à Rússia, vou me dar muito mal nessa guerra, que, moralmente, não posso mais voltar atrás. Pretendo me abrir para a América do Sul, trocando petróleo, gás de cozinha e fertilizantes, por comida, pois a América do Sul é, e sempre será, o celeiro do mundo. Daí a minha pretensão de casar vocês, minhas filhas, com pessoas de alto nível no Brasil, para fincar a bandeira russa neste hemisfério, no sentido político e comercial. Por isto eu pretendo casar vocês com pessoas de alto nível e Bolsonaro veio oferecer dois de seus filhos, o mais velho é advogado e Senador e o outro Deputado pelo Rio de Janeiro. São muito ricos e já viram as suas fotografias e estão dispostos a uma aproximação mais íntima para conhecê-las melhor. O que vocês duas me respondem?
– Eu respondo por mim, – disse Maria Vorontsova – mas preciso conhecê-lo melhor e não resolver com isto uma pendenga política para o bem da Rússia e do Brasil. Casamento para dar certo tem que existir amor, cumplicidade do querer bem um ao outro. Não posso começar sem uma proposta formal da parte dele, publicado na mídia, de querer me conhecer melhor, e, promessa de aprender a nossa língua, antes do casamento. Não quero um intérprete na lua de mel. São essas as minhas condições iniciais.
– E você, Katerina?
– Não conte comigo nesta aventura, disse Katerina Tchekhov. Prefiro morrer solteira a me envolver com homem que não fala russo. Só me caso com russo que me queira de verdade. Não contem comigo para cometer esse absurdo midiático por conta de uma enclausurada filha, proibida pelo pai de conhecer um conterrâneo, qualquer que seja.
– Pelo visto, Putin, vou retirar o oferecimento dos meus filhos nas condições propostas pelas suas filhas. Mas, você pode fincar a sua bandeira no consulado russo no Brasil como nosso aliado. Faço questão de recebê-lo, pisando em tapete vermelho, estendido até a porta do avião. De lá sairemos em carreata de motocicletas até o Palácio Presidencial onde será recebido com honrarias. Você irá na minha garupa acenando para o povo que irão assistir você passar.
– As nossas tratativas políticas e comerciais já foram estabelecidas pelos nossos embaixadores. Vamos mantê-las com alarde na mídia por ambas as partes como países aliados. Isto me ajudaria muito a conquistar os países sul-americanos de língua espanhola. Alguns já se pronunciaram como meu aliados, outros, os mais importantes, não, e, sim, a favor das sansões criadas pelo americanos. Estes, eu preciso conquistá-los, mas, como fazer isto?
– Nós temos uma associação da América Latina que é o Mercosul, passaremos a fazer negócios somente através dele, e, os mais resistentes à Rússia, recebem menos favores de sua parte. Temos ainda a associação do BRIC, ou seja, Brasil, Rússia, Índia e Cuba, todos atualmente seus aliados. Vamos fortalecer comercialmente e politicamente esse tratado, criando a nossa própria moeda de troca, mandando o dólar para o espaço, que só vai servir para limpar bumbum e encher a lata de lixo. Papel moeda não vai valer mais nada daqui há dois anos. Será substituído pelo dinheiro virtual, de créditos e débitos, garantidos apenas por cada uma das instituições bancárias, registradas em seus devidos países. O ouro, que lastreava o dólar e libra, não valerá mais nada, nem mesmo para os dentistas obturarem os dentes. O mundo todo vai mudar daqui para a frente, mas, para onde, ninguém ainda sabe, cabendo apenas especulações. Eu investi meu dinheiro, tantos os bens quantos os mal ganhos, em imóveis, em pontos valorizados que até a qualidade da vizinhança e calçada contam.
– Vamos devagar com o andor, mas mostrando ao mundo a nossa aliança comercial e política, na troca de mercadorias, pelo dinheiro virtual, que iremos acertar seus termos mais adiante. Vou lhe enviar gás de cozinha e fertilizantes à preços módicos em troca de alimentos da mesma forma, numa conta, como disse, virtual, apenas de débitos e créditos, garantidos por nossos países. Isto acirrará o interesse dos outros países Sul-Americanos, mais ligados a América do Norte.
Continua em 22/05/2022 …
Bernardo J. B. Figueiredo é romancista e autor de “Em busca da eternidade”, conto já publicado aqui na Dolce Morumbi®
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Esta publicação é um oferecimento da Associação Criança Brasil, Organização Social que cuida da educação e acolhimento de 840 crianças e adolescentes
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