Existe uma solidão única que só quem ama incondicionalmente conhece. Aquela que não vem da falta de pessoas ao redor, mas sim do silêncio da própria voz que vai se tornando cada vez mais baixa. Do nosso ‘eu’ que se dissolve no meio de tantos ‘preciso’, ‘cuido’ e ‘depois eu vejo’. É a solidão de quem está sempre presente para todos, mas sente que pouco a pouco vai desaparecendo de si mesma. Você pode estar no meio de um almoço de família, rodeada de vozes e risadas, ou no parque, cercada por outras mães, e ainda assim sentir um vazio que envolve como uma segunda pele. Essa é a solidão materna – silenciosa, contraditória e profundamente íntima.
Nos primeiros meses, ela se veste de madrugadas intermináveis, quando o mundo dorme e ficamos acordadas, trocando fraldas com olhos quase se fechando, ouvindo apenas o próprio cansaço como companhia. Mais tarde, se transforma em algo mais sutil: é a sensação de que ninguém realmente entende o peso que carregamos, nem vê as pequenas mortes diárias que acontecem em silêncio – a xícara de café que esfria esquecida, o livro que continua na página 12, o banho demorado que nunca acontece, o desejo que fica para depois…
O mundo pergunta “como está seu filho?”, mas quase ninguém pergunta “como está você?”. As pessoas veem uma mãe, mas será que ainda nos enxergam como mulheres? Nós mesmas às vezes nos perdemos de vista, desaparecemos no emaranhado de demandas que nunca cessam. E o pior é que sequer podemos reclamar, porque afinal, “isso é ser mãe”, não é mesmo? Há um tabu pesado em admitir que nos sentimos sós no meio de tanta vida, como se confessar essa verdade fosse uma traição ao amor que sentimos pelos nossos filhos.

Mas a verdade é que amor e solidão não são opostos – muitas vezes andam de mãos dadas. Quanto mais intensamente amamos, mais profunda pode ser a sensação de que ninguém compartilha verdadeiramente o peso desse amor. E, como já falei em uma matéria anterior, ainda temos as redes sociais, que só pioram a situação, mostrando maternidades perfeitas que não existem, enquanto nos sentimos fraudes por não estar “aproveitando cada momento” como dizem que deveríamos.
A saída, quando existe, vem em pequenos momentos. Talvez naquela amiga que não julga quando dizemos “estou exausta”, no parceiro que finalmente entende que precisamos de uma hora sozinha, ou no estranho no parque que nos dá um sorriso de cumplicidade quando nosso filho faz birra. São pontes construídas sobre esse abismo de incompreensão, tijolo por tijolo.
No fim, talvez a cura não esteja em eliminar completamente essa solidão – porque parte dela é essencial à profundidade da experiência materna – mas em aprender a reconhecê-la, nomeá-la e compartilhá-la. Em entender que não estamos sozinhas em nossa solidão, que há milhões de mulheres por aí sentindo exatamente o mesmo e que cada uma está em sua própria ilha cercada de gente por todos os lados.

E quando menos esperamos, no meio desse oceano de sentimentos contraditórios, surge um momento de pura conexão – um abraço espontâneo do nosso filho, um “eu te amo” sem motivo, um olhar de cumplicidade com outra mãe no supermercado. São brechas de luz nesse labirinto silencioso, lembretes de que mesmo nas horas mais solitárias, nós nunca estamos completamente sós.
E por que sentimos essa solidão? Ela é o fio invisível que nos une a todas as mães que amam até doer, que se esvaziam para encher outros, e que encontram sempre reservas de amor para recomeçar. Dia após dia. Madrugada após madrugada.
E se, em vez de lutarmos contra essa solidão, começássemos a vê-la como um espaço sagrado de transformação? Onde não somos apenas mães, mas mulheres em constante renascimento. Onde a dor do desapego se transforma em sabedoria, o cansaço em resiliência, e o amor que dói se revela, no fim, como a única força capaz de nos fazer infinitas. Talvez a solidão não seja o oposto do amor, mas seu território mais profundo – aquele que, quando ousamos habitar, nos ensina que mesmo no esvaziamento, há sempre um novo começo esperando para nascer.
Ainda não há comentários para esta publicação