Homem versus máquina – a experiência humana nos tempos de inteligência artificial

É inegável que as tecnologias de inteligência artificial podem nos auxiliar com tarefas produtivas, mas nós ainda não perdemos nosso lugar

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Imagem de Freepik

Por Gabrielle Ribon

Nas últimas semanas, é possível que ao abrir seu feed em alguma rede social você tenha se deparado com vídeos criados a partir da Sora, ferramenta de criação de vídeos via inteligência artificial (IA) da OpenAI, empresa responsável pelo ChatGPT. As postagens acompanham os prompts, textos utilizados para dar as coordenadas à ferramenta, e os vídeos gerados pela Sora, que promete criar vídeos realistas e cenas imaginativas a partir de descrições textuais.

A Google não ficou para trás na corrida das ferramentas de uso criativo das Ias, e nas últimas semanas e relançou a Gemini, antiga Bard, que gera textos a partir de instruções simples via chat e promete, inclusive, escrever poemas e peças de teatro. Parece que as IAs querem chegar onde apenas os humanos poderiam ocupar algum lugar: a produção criativa e artística.

A disputa não é de hoje, claro, e muita polêmica já foi criada com a popularização das NFTs para registro de autenticidade de arte digital, ou do uso de imagens e peças que utilizam figuras criadas via IA, onde muitos artistas alegam que tiveram suas artes usurpadas e recicladas sem receberem os devidos créditos ou reconhecimentos. Mas deixando as disputas de direito do autor um pouco de lado, acredito que o grande questionamento é se as inteligências artificiais realmente podem substituir os humanos na produção cultural e de entretenimento.

Em um artigo recente da revista Wired, o colunista e escritor Steven Levy conta sobre uma provocação que fez à sua audiência em um evento de tecnologia. Propôs que os presentes imaginassem terem lido um livro que realmente tivessem gostado e que algo naquele texto tivesse se tornado uma inspiração para a sua vida. Apenas após ter terminado de ler, alguém contaria que o livro não era de autoria humana, mas sim gerado por um sistema de inteligência artificial. Ao perguntar para a audiência quem se sentiria enganado ao terminar o livro sem saber que se trata. Quase todos levantaram a mão.

Esse exercício proposto nos leva a refletir não apenas o motivo de consumirmos arte, cultura e entretenimento, mas também o porquê nos propomos a produzir esses elementos. E ao realizar essa reflexão, talvez seja possível chegar em um lugar que a IA não consegue nos alcançar e que, ouso dizer, nunca poderá nos substituir: a capacidade de criar conexões por meio da produção criativa e o desejo de nos comunicarmos.

É inegável que as tecnologias de inteligência artificial podem nos auxiliar com tarefas produtivas, como revisar um texto, organizar tarefas e projetos, ou sumarizar um conteúdo extenso quando não é necessário se aprofundar em algum tema. No entanto, não é possível imaginar como uma ferramenta de algoritmos poderia replicar a sensação humana que ocorre quando nos conectamos com um conteúdo e temos o prazer de nos comunicar sobre ele.

Seria perfeitamente possível fazer uma postagem em rede social com um vídeo gerado pelo Sora, no qual eu daria comandos sobre o vídeo que eu gostaria que fosse gerado. Mas, imaginando que essa postagem fosse sobre o meu final de semana em família, esse vídeo seria capaz de expressar o que eu experimentei nesse período? Ou, uma pergunta ainda melhor, eu gostaria de terceirizar essa comunicação para uma ferramenta tecnológica?

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Claro, um texto elaborado pelo ChatGPT ou pelo Gemini estariam impecáveis em sua gramática, estrutura, e certamente conseguiriam muitos likes caso o meu prompt estivesse prevendo esse objetivo ao elaborar o texto sobre o meu final de semana. O vídeo certamente seria perfeito, com a música e as filmagens ideais, caso o Sora fosse responsável por elaborá-lo (essa perfeição eu deixo para questionar em outro texto).

No entanto, há a quebra de um pacto aqui, porque tenho certeza de que meus seguidores, amigos e familiares, se sentiriam confusos e passariam a achar vazia uma postagem em que eu falo de uma experiência própria e única, mas que foi terceirizada para uma máquina elaborar a comunicação. Certamente a postagem perfeita não teria tantos likes caso esse segredo fosse revelado. Quem quer ler ou ver de uma máquina a experiência que apenas um humano pode desfrutar?

Ao olhar uma imagem ou um texto elaborado por IA, por mais perfeito que pareça, a sensação é de que nunca irá conseguir capturar o que é ser humano. Falta algo. Assim como o Co-Pilot da Microsoft pode gerar apresentações e atas de maneira ágil e prática, o conteúdo precisa ser humano. E nessa disputa de ser autêntico e estar em situações que geram experiências, conteúdos e muita bagagem para compartilhar, nós ainda não perdemos nosso lugar.

Gabrielle Ribon é advogada e entusiasta de inovação. Atua no mercado financeiro com foco em novos produtos e tecnologias. É especialista em Creative Technologies pela Miami Ad School e titulada LL.M em Direito Tributário pelo Insper.

Colaboração da pauta:

Ela Comunicação

Priscyla Costa | [email protected]

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