Ser educado, colaborativo e gentil são qualidades valorizadas no ambiente profissional. Mas quando a simpatia deixa de ser espontânea e se transforma em um papel forçado, surge um desgaste silencioso: a síndrome do simpático profissional. É aquele comportamento de estar sempre sorrindo e dizendo “sim” para tudo mesmo quando o desejo é o oposto.
“Há profissionais que vivem com medo de desagradar. Querem ser vistos como ‘fáceis de lidar’ e, por isso, suprimem opiniões, emoções e necessidades. Mas essa simpatia performática gera um custo interno muito alto”, afirma Wanderley Cintra Jr., psicólogo especializado em comportamento no trabalho.
Segundo ele, o resultado costuma vir em forma de cansaço crônico, queda de produtividade, irritabilidade, crises de ansiedade e até afastamento da própria essência. “É como se a pessoa estivesse o tempo todo representando um personagem agradável, até esquecer quem é de verdade”.

“Gente boa” o tempo todo
A busca constante por aprovação e aceitação leva muitos profissionais a evitar confrontos a qualquer custo. “Isso pode parecer bom a curto prazo, mas a longo prazo cria relações desequilibradas, onde um lado cede sempre e o outro se acostuma com isso”, explica Cintra. Em cargos de liderança, essa postura pode prejudicar a autoridade e dificultar tomadas de decisão impopulares. Já em cargos operacionais, pode levar à sobrecarga e ao silenciamento de ideias importantes.
Simpático, mas exausto
Cintra alerta que a necessidade de ser sempre bem-visto nasce de inseguranças profundas ou de ambientes de trabalho onde o conflito é demonizado. “O problema é que o excesso de esforço para manter o bom clima pode gerar justamente o contrário: burnout, relações superficiais e falta de autenticidade na equipe”, diz.
Gentileza não é submissão
“Saber a hora certa de ser cordial e a de se posicionar é essencial”, explica Cintra. Gentileza não é sinônimo de subserviência. Profissionais maduros entendem que ser educado não significa renunciar à própria opinião ou da própria saúde mental.

Como estabelecer limites
Cintra defende que é possível ser respeitoso e assertivo ao mesmo tempo. “Dizer ‘não’ com empatia é uma das habilidades mais importantes no mundo corporativo de hoje. Frases como ‘preciso pensar antes de assumir mais essa tarefa’ ou ‘posso ser honesto sobre como estou me sentindo?’ ajudam a criar um diálogo verdadeiro, sem agressividade”.
O psicólogo sugere ainda outras formas de comunicação que permitem preservar o relacionamento profissional sem abrir mão dos próprios limites. Expressões como “no momento, minha agenda está comprometida, mas posso ajudar em outra ocasião”, ou “entendo a urgência, mas preciso de mais informações para avaliar se consigo contribuir”, são alternativas que demonstram boa vontade, sem submissão. Além disso, Cintra recomenda evitar justificativas excessivas. “O excesso de explicação é comum em quem tem dificuldade de se impor. Muitas vezes, um ‘não posso agora’ dito com tranquilidade é suficiente. A firmeza gentil transmite segurança e respeito”.
Autenticidade como valor profissional
Por fim, Cintra reforça que profissionais autênticos, que sabem equilibrar gentileza e posicionamento, constroem relações mais saudáveis e sustentáveis. “Ser simpático não pode significar ser invisível. Às vezes, o maior ato de gentileza é ser honesto”, finaliza.

Wanderley Cintra Jr.,é psicólogo graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina e especializado em comportamento no ambiente de trabalho. Cintra possui mais de 20 anos de experiência em treinamento e desenvolvimento de pessoas, acumulando mais de 55 mil horas de treinamentos ministrados. Já deu entrevistas para O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, UOL, Exame.com, O Globo, Valor Econômico, Você S/A, SBT, Você RH, dentre outros grandes veículos. Tem propriedade para falar de saúde mental, burnout, empreendedorismo, semana de trabalho com quatro dias, liderança, inteligência emocional, carreira, ambiente corporativo, dentre outros temas.