O debate sobre saúde mental no mercado de marketing de influência vem ganhando espaço nos últimos anos — e não por acaso. Pesquisas recentes já apontavam que mais da metade dos influenciadores tanto brasileiros quanto estrangeiros haviam sofrido burnout, especialmente os que ganham menos e trabalham sem suporte profissional. Agora, um novo estudo amplia ainda mais o estado de alerta: influenciadores digitais têm o dobro de chance de desenvolver pensamentos suicidas em relação à população geral.
O levantamento, realizado pela Creators 4 Mental Health e a Lupiani Insights & Strategies, mostra dificuldades generalizadas de saúde mental entre criadores de conteúdo. 52% relatam sofrer de ansiedade, 35% de depressão e 62% enfrentam burnout ocasional ou frequente. A incidência de pensamentos suicidas entre influenciadores aparece significativamente maior que na média populacional; 10% dos creators relatam ter tido pensamentos suicidas relacionados ao trabalho, quase o dobro da taxa de 5,5% observada na população adulta geral dos Estados Unidos, segundo dados do National Institutes Of Health.

A pesquisa ainda indica que esses números pioram quanto mais tempo alguém trabalha como criador de conteúdo. Ao passo que 11% dos influenciadores com menos de dois anos de experiência consideram sua saúde mental como “excelente”, esse número cai para apenas 4% entre aqueles com oito ou mais anos de experiência na área. As taxas de burnout seguem o mesmo padrão: 49% dos creators mais novos relatam sofrer com a condição, enquanto entre aqueles com oito ou mais anos de experiência, o número é de 74%, praticamente um terço a mais.
Especialistas apontam que, à medida que a profissão cresce e se profissionaliza, cresce também a complexidade emocional envolvida no trabalho. A necessidade constante de estar online, entregar resultados, lidar com comentários negativos, administrar expectativas da audiência e negociar com marcas pode se transformar em um ciclo de exaustão profunda para quem enfrenta essa rotina sem apoio.

Para Fabio Gonçalves, diretor de talentos brasileiros e norte-americanos da Viral Nation e especialista em marketing de influência há mais de dez anos, os novos números confirmam uma tendência preocupante: “A saúde mental dos criadores está se tornando o epicentro do debate sobre o futuro da economia dos influenciadores. Se antes falávamos de burnout, agora estamos falando de algo ainda mais grave: um nível de exaustão emocional que pode levar ao adoecimento profundo e a pensamentos suicidas. Isso mostra que o modelo atual de trabalho não é sustentável”.
Gonçalves explica que a vulnerabilidade emocional dos criadores deriva de uma combinação de fatores. “É uma profissão que exige performance contínua sem intervalos, feedback instantâneo da audiência, exposição pública permanente e comparação constante com outros creators. Some isso à instabilidade financeira, ao medo de perder relevância e às dinâmicas tóxicas de algumas plataformas… é um conjunto explosivo”, analisa.

O especialista reforça que o impacto psicológico também está ligado à solidão estrutural do trabalho pelo fato de muitos criadores trabalharem sozinhos, acumulando funções técnicas, criativas, administrativas e comerciais. “Quando você junta a cobrança interna, a cobrança externa e a ausência de suporte profissional, fica muito claro porque esses números são tão alarmantes. Não estamos falando apenas de cansaço, estamos falando de saúde mental em risco real”.
Além disso, o agente lembra que grande parte do público ainda enxerga apenas o lado glamourizado da profissão, o que contribui para minimizar os impactos emocionais por trás das câmeras. “Existe uma percepção equivocada de que o trabalho do influenciador é leve, fácil e sempre divertido. Mas por trás de cada vídeo existe uma exposição permanente, uma necessidade de se posicionar sobre tudo, de lidar com haters, críticas e julgamentos — muitas vezes em escala massiva”, explica.

Segundo ele, essa pressão invisível aumenta ainda mais o risco de adoecimento emocional, especialmente quando o creator não conta com uma rede de apoio fora das telas. “Ter vínculos reais, amigos, família, terapia e um ambiente que não dependa da internet é essencial para que o criador não se perca da própria identidade. Quando tudo gira em torno da performance digital, o impacto psicológico é devastador”.
Diante desse cenário, Gonçalves afirma que o mercado precisa repensar processos e responsabilidades. “As agências e plataformas precisam assumir conscientemente que têm um papel ativo na prevenção desse tipo de situação. Isso significa estruturas de suporte, orientação estratégica, rotinas mais equilibradas, alinhamento de expectativas e, principalmente, humanização. Nós, enquanto agentes, devemos não apenas nos preocuparmos em fechar campanhas, mas também em criarmos um ecossistema saudável. O objetivo é aliviar a sensação de sobrecarga e construir uma trajetória possível, não uma corrida de sobrevivência”.

O estudo conduzido Creators 4 Mental Health (C4MH) em parceria com a Lupiani Insights & Strategies foi realizado através de uma pesquisa online de 10 minutos com 542 criadores de conteúdo norte-americanos, todos com 18 anos ou mais. Os respondentes foram convidados por e-mail a partir de um banco de creators afiliados a organizações parceiras, e passaram por triagem para garantir que eram criadores ativos — em tempo parcial ou integral — que obtêm parte da renda por meio da criação de conteúdo. A coleta de dados ocorreu entre 12 de agosto e 14 de setembro de 2025. A pesquisa completa pode ser acessada em: https://www.creators4mentalhealth.com/study































