Como eram os padrões de beleza das paulistanas há 470 anos

Dolce Selfcare

Cecília Trigueiros

O padrão de beleza do século XVI resumia-se no “tronco”: rosto, busto e ombros

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Pintura de Jean-Baptiste Debret, Public domain, via Wikimedia Commons

Uma daquelas moças era toda tingida, de baixo acima daquela tintura; e certo era tão bem-feita e tão redonda, e sua vergonha (que ela não tinha) tão graciosa, que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições, fizera vergonha, por não terem a sua como ela”.

E Pero continuou, aliás, também sem embaraço nenhum:

Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos, compridos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas, tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos nenhuma vergonha

Para se iniciar um assunto tão rico e histórico, primeiramente é necessário compreender a impressão dos portugueses em relação às índias, de acordo com as famosas Cartas de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal, que enalteceu, deslumbrado, as primeiras habitantes do Novo Mundo.

As índias goianas, naturais do que hoje se entende pela região de São Paulo, andavam nuas e livres, sem pudores, inocentes e com o rosto pintado já desde 1500, estabelecendo um conceito de beleza nativa.

53 anos mais tarde, e mais precisamente num certo planalto, Padre Manoel da Nóbrega, juntamente com alguns jesuítas e indígenas, fundou um povoado que recebeu o nome de Aldeia de Piratininga (peixe seco na língua indígena), a nossa cidade.

Tá bonitas, até aí é aula de história da sétima série…

Pintura de Jean-Baptiste Debret, Public domain, via Wikimedia Commons

Voltando ao tema, o padrão de beleza do século XVI resumia-se no “tronco”: rosto, busto e ombros. E só. Mas vale lembrar que durante a fundação da Vila de Piratininga, havia pouquíssimas mulheres e a vida era dura e sem tempo para produções.

Algumas décadas adiante, e já povoada, o vilarejo foi gradualmente crescendo e as mulheres que ali habitavam seguiam os moldes estéticos e comportamentais europeus.

De lá para cá, vocês hão concordar que certos hábitos não mudaram muito, uma vez que, desde sempre, a gordura corporal é associada ao ócio e desleixo, o que deixa bem evidente a maneira como eram vistas naquela época, as mulheres mais rechonchudas.

3 vaias para a Vila de Piratininga!

Quando eu escrevo “rechonchudas”, nem de longe posso equiparar aos padrões ditados hoje em dia: mulheres mais corpulentas sempre foram valorizadas nos séculos passados, o que difere muito do conceito atual de se estar “acima do peso”.

Cabelos longos e olhos castanhos eram a tendência. Bonitas pasmem, o megahair das nossas antepassadas paulistanas era tão disputado, que até cabelo de mulher morta era vendido a preço de ouro!

Pausa para o Vonau…eca!

Apesar dos apliques, a vaidade não tinha um lugar central na vida da mulher nesse período. Preocupar-se com a própria aparência era um pecado perseguido pela Igreja e condenado pela sociedade. Espelhos não serviam para dar aquele retoque final na beauté, mas sim, como meros aparatos decorativos da sala.

Casa rural da Vila de São Paulo, onde a estrutura europeia de habitação se mesclava a elementos indígenas como a parede de taipa e a cobertura de palha. Obra de José Washt Rodrigues. In: Atlas Histórico Escolar, MEC-Fename, 1980. Uso amparado pela Lei 9610/98

Você consegue se imaginar em frente à um espelho e não dar uma ligeira ajeitada no visual? Seria o mesmo que dizer à um homem para não olhar a Final da Copa do Mundo…Existe semelhante hipótese?

De acordo com a historiadora Mary Del Priore, “A avaliação da mulher sobre si mesma estava sempre no olhar do outro. Esse olhar é centrado por outros critérios (fora a beleza). Estavam interessados na família ser rica, ter terra, escravos; na educação, ser menina católica e religiosa”, afirma a especialista.

Em poucas palavras, as paulistanas, assim como todas as mulheres do restante do Brasil, não tinham vontade própria e sofriam pressão religiosa, fazendo o próprio corpo ser pecaminoso e a vaidade, algo praticamente inexistente.

Digo praticamente, porque mulher é mulher, desde que o mundo é mundo e, embora debaixo de tantas restrições, sempre dá-se um jeito e havia um lugarzinho do corpo para sentirem-se bonitas: a cabeça. Mesmo que a vasta cabeleira fosse originalmente de um defunto!

E assim eram as nossas antepassadas, tão diferentes das indígenas que causaram uma fascinação espantosa nos primeiros navegantes que por aqui aportaram.

Passaram-se 470 anos e hoje é aniversário de São Paulo e olhem só o quanto mudou!

Ire’ẽ ĩrũ!”, em tupi-guarani, ou, para nós, “Felizmente!”!

Parabéns, Aldeia de Piratininga!

Pintura de Jean-Baptiste Debret, Public domain, via Wikimedia Commons

Cecília Trigueiros é formada em Marketing e maquiadora profissional e especialista em autocuidado e beleza. 

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