Dr. Fabiano Lourenço de Castro
Possibilidade de exclusão ou redução da multa por fato imprevisível
A situação financeira das empresas brasileiras, em razão do corona vírus, está sendo drasticamente afetada, tendo como consequência, a redução da produção de bens, sua comercialização e o consumo. Isto infelizmente é público e notório. Nesse momento, ainda não é possível definir o tamanho do impacto na economia brasileira e os setores que serão mais atingidos. Entretanto, é possível afirmar que as relações contratuais serão inevitavelmente atingidas, o que já começa a ocorrer. Há inúmeros contratos e/ou acordos celebrados em uma realidade econômica e, que estão sendo executados num cenário de crise como o vivido pelo Brasil e o mundo, em decorrência da pandemia do covid19.
É verdade que o contrato ou qualquer acordo obriga as partes, porém, essa regra não pode ser vista de forma absoluta, pois o panorama contratual atual é absolutamente diverso daquele, no qual a negociação fora firmada. Recentemente, movemos uma ação anulatória de acordo judicial, que recebeu o nº 1034365-62.2020.8.26.0002, na qual estamos questionando basicamente a multa moratória de 50% (cinquenta por cento) que foi imposta pelo credor, para o caso de inadimplemento de qualquer parcela do acordo. No acordo judicial, estipulou-se o pagamento do débito em 8 (oito) parcelas mensais e consecutivas, e antes da suspensão das atividades comerciais, não essenciais, na cidade de São Paulo, o devedor já havia quitado 5 (cinco) prestações. Em resumo, o devedor deixou de pagar as parcelas vencidas em 10/04/2020, 10/05/2020 e 10/06/2020. É importante esclarecer que o devedor é um restaurante de comida árabe que suspendeu as atividades comerciais em 19 de março de 2020, e que até o momento continuam sobrestadas. É evidente que o devedor somente deixou de pagar as 3 (três) últimas parcelas, por conta da suspensão da sua atividade, ou seja, em decorrência de um fato posterior e totalmente imprevisível, e que deixou o mundo todo completamente perplexo. Infelizmente, apesar de toda argumentação, o credor não se sensibilizou com o atual cenário e exigiu o valor devido, com a inclusão da multa de 50% (cinquenta por cento). Isso obrigou o devedor a mover uma ação anulatória, visando alterar a cláusula que lhe impôs a obrigação de pagar a mencionada penalidade, e que se tornou extremamente excessiva.
A juíza que conduz o caso deferiu uma medida liminar, excluindo a obrigação do devedor de pagar o débito com a inclusão da sanção. Essa decisão tem por base, por exemplo, o artigo 413 do Código Civil, ora transcrito e outras regras legais que podem ser aplicadas a casos semelhantes: “Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio”. Abaixo, segue o resumo de uma recente decisão, proferida recentemente pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, e que está em sintonia com os argumentos apresentados na ação anulatória:- “Ação de cobrança – Taxa Associativa – Sentença de improcedência – Insurgência da requerente – Requerida que realizou o pagamento das taxas de manutenção durante período expressivo e celebrou acordos para quitação das taxas em atraso – Comprovada a anuência da ré em se associar à autora – Dever de pagamento das taxas associativas caracterizado – Multa moratória de 20% – Penalidade excessiva – Redução para 2% – Sentença reformada – Recurso provido em parte. (TJSP; Apelação Cível 1021451-94.2019.8.26.0100; Relator (a): Marcia Dalla Déa Barone; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 13ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/07/2020; Data de Registro: 10/07/2020)”. Como pode ser constatado, a ideia de que um contrato ou acordo são intransponíveis é um ledo engano. Há outras regras e princípios que dão sustentação à alteração e exclusão de sanções abusivas.
Dr. Fabiano Lourenço de Castro
Lourenço de Castro Advogados
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